Mães e pais não devem abrir mão de sua autoridade que pressupõe responsabilidade junto a seus filhos, mas essa relação deve ser consciente de que através do diálogo a família sempre crescerá cada vez mais na superação dos problemas.
Diante desse caminho, trazemos hoje um texto da Psicopedagoga Isabel Cristina que escreveu um artigo intitulado "Como assim, Piercing?" em que trata justamente do diálogo como pressuposto para um bom entendimento nas relações familiares dentro de casa.
“O que é isso na sua língua filho?”.
Um piercing, pai!
Como assim, piercing?
Calma pai. Não é doença e todo mundo usa!
Como todo mundo usa...Eu e sua mãe não usamos essa coisa horrível!
Ô , pai! Todo mundo da minha idade...
Tua mãe já viu isso?”
Muitos pais acreditam que estão iniciando um diálogo com seus filhos adolescentes quando o abordam com uma interrogação como a exemplificada no início do texto. Ficam terrivelmente assustados e desconcertados diante da notícia que seu filho adolescente está usando piercing. Alguns nem sabem o que é um Piercing, mas antecipadamente acham que não deve ser bom. Já com a avaliação feita, esperam dialogar com seu adolescente.... Ledo engano!
O diálogo deve pressupor uma troca, uma conversa em que as partes colocam seus pontos de vista. Não é obrigatório chegarem a uma única conclusão, mas espera-se que cheguem ao entendimento de como cada um pensa. É diferente se a intenção do pai é ser obedecido. Neste caso, o pai deve ter um rol de motivos que possam ser apresentados com clareza. Pode-se ter um diálogo e, após a compreensão do ponto de vista do filho, o pai entender que ele deve obedecê-lo. Esta é uma prerrogativa de ser pai e mãe. Se os pais educaram seus filhos com autoridade, diálogo e afeto, por que não? Conheço pais que não permitiram que seus filhos fizessem tatuagem por ser um procedimento definitivo e combinaram que aos 18 anos o filho poderia decidir sozinho. Conheço outro pai que descobriu que seu filho tinha uma tatuagem e aceitou. O tipo de autoridade e de conversa que se estabelece entre pais e filhos é decorrência da educação que foi dada durante toda a infância. Se o adolescente é muito distante e nunca conversa, ou se ele pode tudo, vai decidir sem consultar seus pais.
O piercing está em moda no meio da garotada e faz parte da “atitude” de alguns jovens. Não designa nenhuma ideologia ou filosofia. É um enfeite, um adorno, um objeto de vaidade e embelezamento tipicamente tribal-adolescente. Se os adultos começarem a usar piercing, eles inventarão outro jeito de transgredir. Um tempo atrás foi a saia de cós baixo e a mini blusa para as meninas, o brinco e o rabo de cavalo, para os meninos. A tatuagem foi atitude transgressiva para os jovens na década de 70, assim como foi a mini saia e muitos outros hábitos que hoje fazem parte do dia a dia de jovens e adultos.
Transgressão faz parte do conceito de juventude. A transgressão pode ser criativa ou destrutiva. O jovem que estoura bombas no banheiro, que se droga ou que faz rachas com o carro de seus pais está transgredindo de forma destrutiva. Por outro lado, o jovem que se enfeita com um topete verde e coloca um piercing na língua está transgredindo de forma criativa. A grafitagem, por exemplo, foi uma evolução da transgressão sem sentido, que é a pichação, para uma demonstração de criatividade e beleza.
Outro item que deve compor o conceito de juventude é a cumplicidade e a imitação. Estes comportamentos atendem a fase do desenvolvimento em que os jovens estão se diferenciando de seus pais para poderem assumir um lugar adulto na sociedade.
A necessidade do adolescente de diferenciar-se do adulto e da criança é uma fase do desenvolvimento, que como toda fase, espera-se que passe. O piercing, os cabelos roxos e outros comportamentos adolescentes são uma linguagem que na maioria das vezes nos comunica “veja como sou bonito” ou “eu sou diferente de vocês” ou ainda, “eu não vou cair no esquema ..não serei igual a vocês – caretas!” No entanto, é preciso conversar, perguntar, dar limites e ouvir as respostas.
Por outro lado, o jovem que é super bonzinho e não causa trabalho algum ou nenhuma estranheza é preocupante, pois não está cumprindo com os ritos de passagem para a juventude. O jovem que não sente necessidade de diferenciar-se de seus pais e nem constrói cumplicidade com seus pares pode correr o risco de continuar criança e passar a sua juventude em casa, de pijama, vendo TV ou jogando no computador e brigando com os irmãos.
Não podemos deixar de considerar que a aparência jovem tornou-se em nossa sociedade um ideal a ser atingido. Todos querem parecer jovens. As crianças, muito cedo, querem vestir roupas e comportarem-se como jovens. Os adultos prolongam, com estratégias das mais variadas e criativas, a aparência juvenil. Portanto, ao que é realmente jovem, fica ainda mais complicado ser jovem e, diante desta disputa, a rebeldia acaba tomando uma dimensão realmente diferenciadora.
Nós, pais e educadores devemos ter condições de dar limites para os nossos filhos, pensando sempre que eles contam conosco e com o nosso bom senso. Sabemos muito bem que o Piercing pode inflamar ou causar acidentes. Sabemos também, que faz parte da juventude a transgressão, logo, devemos construir regras que suportem essa possibilidade sem que com isso percamos nossos jovens de vista. Nosso papel é ajuda-los a viverem a adolescência com tudo que ela tem de bom e que nossos jovens saiam da adolescência adultos bem formados e sem marcas definitivas, a não ser as lembranças...
A adolescência é uma fase passageira e que seja passageiro tudo que ela propicia.
O piercing dá para tirar e o máximo que deixa são fotos e, talvez, uma pequena cicatriz. As fotos poderão provocar boas risadas e a cicatriz excelentes histórias para serem contadas.
Quem nunca ouviu de um filho ao ver a foto de seus pais, “mãe/pai, você usava isso? Que ridículo!”
Vale a pena relembrar que conversar se aprende conversando!
Isabel Cristina Hierro Parolin,
Psicopedagoga
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